Homélia era uma menina encantadora, adorava brincar com as coisas de sua mãe.
Passava horas e horas em frente a penteadeira, se arrumando fasceira para um príncipe, uma festa no reino vizinho, um jantar de comemoração e tudo o mais que sua vasta imaginação permitia. Vestia-se de jóias, lenços, saias e vestidos, passava o blush como quem pinta um quadro, numa delicadeza de flor.
Mas de todos os itens o que ela mais gostava eram dos sapatos de sua mãe, vesti-los em seus pés pequenos era como entrar numa nave espacial e viajar para um outro universo, onde ela era grande, elegante e adorada. Eram muitos os portais, tinha um amarelo canário de bico fico que ela usava em fantasias mais casuais como por exemplo, quando ela ia para seu escritório ou visitar a rainha da Inglaterra; o cor de rosa de bico redondo ela só usava quando era princesa; já o preto bico fino e salto 15 só era vestido para matar os inimigos de James Bond ou imitar a Liza; e sua mãe tinha muitos sapatos, eram cores quentes, frias e neutras, saltos finos, altos, grossos, baixos, bicos redondos, finos, com pedraria, laço ou liso, e tudo isso significa que situações não faltavam na cabecinha fantasiosa de Homélia que era tão criteriosa, mas havia dias também em que ela brincava com todos eles de uma vez, mas isso só quando era quinta feira - dia de desfile de sapato.
A menina foi crescendo, e seu pé foi se encaixando cada vez mais nas naves espaciais de sua imaginação, em compensação, ao passar do tempo sua imaginação ia cabendo cada vez menos nos sapatos.
Mas o fato é que a menina nunca deixou de amar sapato, tanto que ela cresceu, cresceu, cresceu e se transformou numa estilista de sapatos, e sua grife ia muito bem, muito famosa, até que um dia ela simplesmente não conseguiu mais criar nenhum modelo novo, sua imaginação tinha sido absorvida por um espaço negro que tomava conta de suas idéias, nada saía daquela cachola.
Dias e mais dias se passaram, nada lhe ocorria, nenhuma imagem, nehuma novidade, nem sequer uma idéia de cor...nada.
Homélia se desesperou, voltou para a casa da mãe fugida das cobranças de sua empresa, dos empresários, do público, de todos. Agora a menina sequer conseguia vestir um sapato.
O interessante é que agora os sapatos a deixavam triste e amargurada, acabou-se o sonho de menina.
Ela tentou buscar inspiração vestindo os sapatos de sua mãe, devorando catálogos de outras marcas, olhando os pés de celebridades, perguntando à pessoas ricas e famosas o que elas queriam, ela procurou olhar para tudo que era lindo e cintilante, buscou no glamour suas idéias, visitou joalherias, salões de festas, lojas de vestidos...e nada. Nada.
Homélia desistiu, jogou a toalha, deu um W.O. pra vida e ficou triste, muito triste, mais triste do que antes, Homélia ficou realmente deprimida, afinal de contas, esses foram os piores seis meses de sua existência.
Numa manhã Homélia acordou mais uma vez desolada, mas o dia estava lindo, o sol lá fora lhe chamava, ela então saiu, foi até o lago perto da casa de sua mãe, ela costumava brincar lá quando criança, foi lá pensar o que iria fazer da vida agora, andou seriamente em vender bolo pra fora.
Ao chegar no lago, sentou numa pedra e seu olhar se perdeu nas águas, ficou lá um tempão. Foi então que num suspiro longo ela percebeu ao seu lado uma borboleta, e encantada percebeu nas flores, no verde, no lago e em tudo uma outra realidade, Homélia se tornou de novo aquela menina dos contos de fada, das histórias mirabolantes e dos chás com a rainha. Homélia voltou a sonhar, e imersa nesse novo mundo de sonhos, onde tudo era mais colorido, mais vivo, mais brilhante, ela criou a coleção mais linda de sapatos que o mundo já viu e foi assim sucessivamente, pois agora Homélia, a menina, nunca mais abandonou o seu mundo de fadas e foi assim assim, na simplicidade da vida que Homélia realmente se tornou grande.
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